O Espiritismo serve para provar materialmente a existência do mundo espiritual. Sendo o mundo espiritual formado pelas almas daqueles que viveram, resulta de sua admissão a prova da existência da alma e sua sobrevivência ao corpo.


As almas que se manifestam nos revelam suas alegrias ou seus sofrimentos, segundo o modo por que empregaram o tempo de vida terrena; nisto temos a prova das penas e recompensas futuras.


Descrevendo-nos seu estado e situação, as almas ou Espíritos retificam as idéias falsas que faziam da vida futura e, principalmente, acerca da natureza e duração das penas.


Passando assim a vida futura do estado de teoria vaga e incerta ao de fato conhecido e positivo, aparece a necessidade de trabalhar o mais possível, durante a vida presente, que é tão curta, em proveito da vida futura, que é indefinida.


Suponhamos que um homem de 20 anos tenha a certeza de morrer aos 25 anos; que fará ele nestes cinco anos que lhe restam? Trabalhará para o futuro? Certamente que não; procurará apreciar o mais possível, acreditando ser uma tolice submeter-se a fadigas e privações, sem proveito. Se, porém, ele tiver a certeza de viver até os 80 anos, seu procedimento será outro, porque então compreenderá a necessidade de sacrificar alguns instantes do repouso atual para assegurar o repouso futuro, durante longos anos. O mesmo se dá com aquele que tem a certeza da vida futura.


A dúvida relativamente a esse ponto conduz naturalmente a tudo sacrificar aos prazeres do presente; daí ligar-se excessiva importância aos bens materiais.


A importância que se dá aos bens materiais excita a cobiça, a inveja e o ciúme do que tem pouco contra aquele que tem muito.


Da cobiça ao desejo de adquirir, por qualquer preço, o que o vizinho possui, o passo é simples; daí ódios, processos, guerras e todos os males engendrados pelo egoísmo.


Com a dúvida sobre o futuro, o homem, acabrunhado nesta vida pelo desgosto e pelo infortúnio, não vê senão na morte o termo dos seus sofrimentos; e assim, nada esperando, procura pelo suicídio a aproximação desse termo. Sem esperança de futuro é natural que o homem seja afetado e se desespere com as decepções por que passa. Os abalos violentos que experimenta lhe repercutem no cérebro e são a fonte da maioria dos casos de loucura.


Sem a vida futura, a atual se torna para o homem a coisa capital, o único objeto de suas preocupações, ao qual ele tudo subordina; por isso, quer aproveitar a todo custo, não só os bens materiais como as honrarias; aspira a brilhar, elevar-se acima dos outros, eclipsar os vizinhos por sua posição; daí a ambição desordenada e a importância que liga aos títulos e a todos os efeitos da vaidade, pelos quais ele é capaz de sacrificar a própria honra, porque nada mais vê além. 


A certeza da vida futura e de suas consequências muda-lhe totalmente a ordem de ideias e lhe faz ver as coisas por outro prisma; é um véu que se levanta descobrindo imenso e esplêndido horizonte.


Diante da infinidade e grandeza da vida de além-túmulo, a vida terrena some-se, como um segundo na contagem dos séculos, como o grão de areia ao lado de uma montanha. Tudo se torna pequeno, mesquinho, e ficamos pasmos de haver dado importância a coisas tão efêmeras e pueris. Daí, no meio dos acontecimentos da vida, uma calma, uma tranquilidade que já constituem uma felicidade, comparadas às desordens e tormentos a que nos sujeitamos com o objetivo de nos elevarmos acima dos outros; daí, também, para os sofrimentos e decepções, uma indiferença que, tirando todo motivo de desespero, afasta numerosos casos de loucura e desvia forçosamente o pensamento do suicídio.


Com a certeza do futuro, o homem espera e se resigna; com a dúvida perde a paciência, porque nada espera do presente.


O exame daqueles que já viveram, provando que a soma da felicidade futura está na razão do progresso moral efetuado e do bem que se praticou na Terra; que a soma de desditas está na razão dos vícios e más ações, imprime em quantos estão bem convencidos dessa verdade uma tendência, muito natural, para fazer o bem e evitar o mal.


Quando a maioria dos homens estiver convencida dessa ideia, quando ela professar esses princípios e praticar o bem, este, impreterivelmente, triunfará do mal aqui na Terra; procurarão os homens não mais se molestarem uns aos outros, regularão suas instituições sociais — tendo em vista o bem de todos, e não o proveito de alguns; em uma palavra, compreenderão que a lei da caridade ensinada pelo Cristo é a fonte da felicidade, mesmo neste mundo, e assim basearão as leis civis sobre as leis da caridade.


A demonstração da existência do mundo espiritual que nos cerca e de sua ação sobre o mundo corporal é a revelação de uma das forças da natureza e, por consequência, a chave de grande número de fenômenos até agora incompreendidos, tanto na ordem física quanto na moral.


Quando a ciência levar em conta essa nova força até hoje desconhecida, retificará imenso número de erros provenientes de atribuir tudo a uma única causa: a matéria. O conhecimento dessa nova causa, nos fenômenos da natureza, será uma alavanca para o progresso, produzirá o efeito da descoberta de um agente inteiramente novo.


Com o auxílio da lei espírita, o horizonte da ciência se alargará, como se alargou com o da lei da gravitação.


Quando do alto de suas cátedras os sábios proclamarem a existência do mundo espiritual e sua participação nos fenômenos da vida, eles infiltrarão na mocidade o contraveneno das idéias materialistas, em vez de predispô-la à negação do futuro.


Nas lições de filosofia clássica, os professores ensinam a existência da alma e seus atributos, segundo as diversas escolas, mas sem apresentar provas materiais.


Não parece estranho que, quando se lhes fornecem as provas que não tinham, eles as repilam e classifiquem de superstições?


Não será isso o mesmo que confessar a seus discípulos que eles lhes ensinam a existência da alma, mas que de tal fato não tem prova alguma?


Quando um sábio emite uma hipótese, sobre um ponto de ciência, procura com empenho e colhe com alegria tudo o que possa demonstrar a veracidade dessa hipótese; como, pois, um professor de filosofia, cujo dever é provar a seus discípulos que eles têm uma alma, despreza os meios de lhes fornecer uma patente demonstração?


Suponhamos que os Espíritos sejam incapazes de ensinar-nos alguma coisa além do que já sabemos, ou do que por nós mesmos poderemos saber; vê-se que só a demonstração da existência do mundo espiritual conduz forçosamente a uma revolução nas idéias; ora, uma revolução nas idéias não pode deixar de produzir outra na ordem das coisas. É esta revolução que o Espiritismo prepara.


Os Espíritos, porém, fazem mais que isso; se as suas revelações são rodeadas de certas dificuldades, se elas exigem minuciosas precauções para se lhes comprovar a exatidão, não é menos real que os Espíritos esclarecidos — quando sabemos interrogá-los e quando lhes é permitido — podem revelar-nos fatos ignorados, dar-nos a explicação do que não compreendemos e encaminhar-nos para um progresso mais rápido. É nisto, sobretudo, que o estudo sério e completo da ciência espírita é indispensável, a fim de só se lhe pedir o que ela pode dar e do modo por que o pode fazer; ultrapassando esses limites é que nos expomos a ser enganados.


As menores causas podem produzir grandes efeitos; assim como de um grãozinho pode brotar uma árvore imensa, a queda de um fruto fez descobrir a lei que rege os mundos; as rãs, saltando num prato, revelaram a potência galvânica; também do fenômeno vulgar das mesas girantes saiu a prova da existência do mundo invisível, e, desta, uma doutrina que, em alguns anos, fez a volta do mundo e pode regenerá-lo pela verificação da realidade da vida futura.


O Espiritismo não descobriu nem inventou os Espíritos, como não descobriu o mundo espiritual, no qual se acreditou em todos os tempos; todavia, ele o prova por fatos materiais e o apresenta em sua verdadeira luz, desembaraçando-o dos preconceitos e ideias supersticiosas, filhos da dúvida e da incredulidade.



Referências:

O que é o Espiritismo? - Cap. II - Allan Kardec

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