Também vos digo: granjeai amigos com as riquezas da injustiça. – Jesus. (Lucas, 16:9.)
A prática do Espiritismo tem sua importância, principalmente, no desenvolvimento e na aplicação do Evangelho, e só é possível a realização do trabalho que executamos se nos tornarmos cristãos decididos, vigorosos de ânimo, sem nos deixarmos abater pelos percalços que porventura surjam no ambiente espírita, ajudando-nos uns aos outros, sempre com o objetivo de produzir vantagens substanciais para prosperidade e elevação de todos os companheiros. Como enfrentar as situações nos entrechoques das múltiplas provações sem a força e o apoio daqueles que lutam, como nós, nas experiências do serviço abençoado que o Espiritismo oferece? Como manter o idealismo fervoroso de servir com perseverança à Causa de Jesus, na tarefa vultosa que nos dispomos a executar, sem renovar as próprias convicções de solidariedade e indulgência para com aqueles que vivem idênticas condições de espíritas, especialmente nos momentos em que demonstrem fraquezas e descuidos? Ao analisar a nossa posição diante dos outros, muitas vezes isolando-nos daqueles com quem fomos chamados a conviver, Emmanuel aconselha-nos: [...] se revisarmos o íntimo da alma, aí surpreenderemos a lógica e a justiça, induzindo-nos ao reexame de todos os problemas dessa natureza, ainda mesmo os mais intrincados; sobretudo, se já aceitamos Jesus por Mestre, perceberemos, de imediato, o apelo da vida a que assumamos nosso lugar, no quadro das obrigações que a fraternidade nos traça ao caminho, compreendendo, por fim, que se os outros não nos compreendem, permitindo que a incompreensão nos alcance, nós podemos compreendê-los, iniciando a jornada de esforço para o reencontro da harmonia entre nós. Para isso, é necessário que o nosso espírito se deixe comandar pelo amor [...].2 Sentimentos de ódio e malquerença ficaram para trás! Por muitos séculos, cultivamos vinditas contra aqueles que não comungavam com as crenças que professávamos ou se tornaram adversários dos ideais que proclamávamos. Soubemos utilizar argumentos brilhantes na defesa dos interesses particularistas, nos púlpitos onde discursávamos com veemência, sem nenhuma noção de que a palavra de Jesus arremessaria por terra antigos preceitos de domínio e de crueldade. Essas ideias foram abandonadas, mas, ainda hoje, é possível perceber alguns vestígios daqueles costumes. Allan Kardec, que soube transmitir, claramente, os objetivos do Espiritismo, secundado pelos Espíritos superiores, analisa, logo ao primeiro capítulo de A Gênese, as condições das religiões e seus seguidores, de épocas passadas, considerando que essas doutrinas, de certa forma, semearam “os germens do progresso, que mais tarde haviam de desenvolver-se [...] à luz brilhante do Cristianismo”.3 No entanto, reconhece: Infelizmente, as religiões hão sido sempre instrumentos de dominação [...] e tem-se visto surgir uma multidão de pretensos reveladores ou messias, que, valendo-se do prestígio deste nome, exploram a credulidade em proveito do seu orgulho, da sua ganância, ou da sua indolência [...].3 É, pois, sabido que sofremos nessa existência as consequências dos erros que perpetramos no pretérito e que esses efeitos perdurarão enquanto nos deixarmos atrair pelas causas que os produziram. Ao persistirmos, por exemplo, em certas antipatias, sem nos esforçarmos por corrigir nossos temperamentos desabridos ou intolerantes, principalmente para com os que atuam na labuta espírita, dificilmente haveremos de aproveitar esta encarnação com o intuito de vencer determinadas tendências que ainda nos qualificam como seres muito imperfeitos. Nem sempre, porém, todas as criaturas se sentirão à vontade ao nosso lado. Mesmo assim, somos chamados a ajudar aquelas que não nos aceitam, orando e vibrando para que possam prosseguir na sua trajetória imortal repletas de oportunidades de ascensão espiritual.A importância da amizade é destacada por Kardec, em nota da questão 938a, de O Livro dos Espíritos: A Natureza deu ao homem a necessidade de amar e de ser amado. Um dos maiores gozos que lhe são concedidos na Terra é o de encontrar corações que com o seu simpatizem. Dá-lhe ela, assim, as primícias da felicidade que o aguarda no mundo dos Espíritos perfeitos, onde tudo é amor e benignidade. Desse gozo está excluído o egoísta.4 A alegria que sentimos junto aos verdadeiros amigos é inigualável! Mormente, quando podemos ajudá-los de alguma forma. No diálogo edificante entre Jesus e Pedro, em meio à paisagem bucólica de Cafarnaum, registrado na belíssima obra Boa Nova, o Mestre fala sobre como proceder quando os amigos não nos entendem: – Pedro, o amor verdadeiro e sincero nunca espera recompensas. A renúncia é o seu ponto de apoio, como o ato de dar é a essência de sua vida. A capacidade de sentir grandes afeições já é em si mesma um tesouro. A compreensão de um amigo deve ser para nós a maior recompensa. Todavia, quando a luz do entendimento tardar no espírito daqueles que amamos, deveremos lembrar-nos de que temos a sagrada compreensão de Deus, que nos conhece os propósitos mais puros. Ainda que todos os nossos amigos do mundo se convertessem, um dia, em nossos adversários, ou mesmo em nossos algozes, jamais nos poderiam privar da alegria infinita de lhes haver dado alguma coisa...5 Não coloquemos empecilhos em nos aproximar daqueles que se tornaram motivo de estorvo para nós; as inimizades atuais, geralmente, se originam dos equívocos cometidos em períodos transatos. Aproveitar o retorno ao corpo de carne significa, essencialmente, estreitar os laços de afeto entre familiares, amigos, conhecidos, entre outros, sem desconhecermos que precisamos aprender a amar os desafetos, que reencarnam, igualmente, na esperança de se reconciliarem com seus adversários. A paz que almejamos resulta dessa harmonia com o próximo e com a nossa consciência, pois granjear amigos é cultivar a fraternidade sincera, real e definitiva em nossos corações.
Deixe seu Comentário
Muito Bom