Jesus, transportado pelo diabo ao pináculo do Templo, depois ao cume de uma montanha e

por ele tentado, constitui uma daquelas parábolas que lhe eram familiares e que a

credulidade pública transformou em fatos materiais.

*

* A explicação que se segue é reprodução textual do ensino que a esse respeito deu um

Espírito.

“Jesus não foi arrebatado. Ele apenas quis fazer que os homens compreendessem que a

humanidade se acha sujeita a falir e que deve estar sempre em guarda contra as más

inspirações a que, pela sua natureza fraca, é impelida a ceder.

A tentação de Jesus é, pois, uma figura e fora preciso ser cego para tomá-la ao pé da letra.

Como pretenderíeis que o Messias, o Verbo de Deus encarnado, tenha estado submetido,

por algum tempo, embora muito curto fosse este, às sugestões do demônio e que, como o

diz o Evangelho de Lucas, o demônio o houvesse deixado por algum tempo, o que daria a

supor que o Cristo continuou submetido ao poder daquela entidade? Não; compreendei

melhor os ensinos que vos foram dados.

O Espírito do mal nada poderia sobre a essência do bem. Ninguém diz ter visto Jesus no

cume da montanha, nem no pináculo do Templo. Certamente, tal fato teria sido de natureza

a se espalhar por todos os povos. A tentação, portanto, não constituiu um ato material e

físico. Quanto ao ato moral, admitiríeis que o Espírito das trevas pudesse dizer àquele que

conhecia sua própria origem e o seu poder: “Adora-me, que te darei todos os remos da

Terra?” Desconheceria então o demônio aquele a quem fazia tais oferecimentos? Não é

provável. Ora, se o conhecia, suas propostas eram uma insensatez, pois ele não ignorava

que seria repelido por aquele que viera destruir-lhe o império sobre os homens.

“Compreendei, portanto, o sentido dessa parábola, que outra coisa aí não tendes, do mesmo

modo que nos casos do Filho Pródigo e do Bom Samaritano. Aquela mostra os perigos que

correm os homens, se não resistem à voz íntima que lhes clama sem cessar: ‘Podes ser

mais do que és; podes possuir mais do que possuis; podes engrandecer-te, adquirir muito;

cede à voz da ambição e todos os teus desejos serão satisfeitos.

’ Ela vos mostra o perigo e

o meio de o evitardes, dizendo às más inspirações: Retira-te, Satanás ou, por outras

palavras: Vai-te, tentação!

“As duas outras parábolas que lembrei mostram o que ainda pode esperar aquele que, por

muito fraco para expulsar o demônio, lhe sucumbiu às tentações. Mostram a misericórdia

do pai de família, pousando a mão sobre a fronte do filho arrependido e concedendo-lhe,

com amor, o perdão implorado. Mostram o culpado, o cismático, o homem repelido por seusirmãos, valendo mais, aos olhos do Juiz Supremo, do que os que o desprezam, por praticar

ele as virtudes que a lei de amor ensina.

“Pesai bem os ensinamentos que os Evangelhos contêm; sabei distinguir o que ali está em

sentido próprio, ou em sentido figurado, e os erros que vos hão cegado durante tanto tempo

se apagarão pouco a pouco, cedendo lugar à brilhante luz da Verdade.

— João Evangelista,

Bordéus, 1862.


Referências:

A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo - Cap. XV - Allan

Kardec


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