ntônio Gonçalves da Silva nasceu na Freguesia das Águas Santas (Portugal), em 19 de março de 1839. Aos 11 anos, emigrou para o Brasil, vivendo três anos no Rio de Janeiro, transferindo-se depois para Campinas (São Paulo), onde trabalhou por alguns anos na lavoura.

Mais tarde fixou residência na capital bandeirante, dedicando-se à venda de jornais. Naquela época, São Paulo era uma cidade de 30 mil habitantes. Ele entregava jornais de casa em casa, conquistando, nessa profissão, a simpatia e a amizade dos seus fregueses. Muito ativo, correndo daqui para acolá a gente da rua o apelidava "O BATUÍRA" (nome que o povo dava à narceja, ave pernalta muito ligeira, de vôo rápido, que freqüentava os charcos, à volta dos lagos).

Convivendo com os acadêmicos de Direito do Largo de São Francisco, passou a se dedicar à arte teatral: montou pequeno teatro à rua Cruz Preta (depois denominada Senador Quintino Bocaiúva). Quando aparecia em cena, Batuíra era aplaudido e os estudantes lhe dedicavam versos como estes: "Salve, grande Batuíra/ Com Teus dentes de traíra/Com teus olhos de Safira/Com tua arte que me inspira/Nas cordas da minha lira/Estes versos de mentira".

Àquela altura da sua vida, passou a fabricar charutos, o que fez prosperar suas finanças. Abriu diversos lotes de terrenos no Lavapés, onde construiu sua residência e, ao lado, uma Rua Particular de casas que alugava aos humildes e que hoje se chama Rua Espírita.

De espírito humanitário e idealista, aderiu, desde logo, à Campanha Abolicionista, trabalhou denotadamente ao lado de Luiz Gama e Antônio Bento. Em sua casa, ele abrigava os escravos foragidos e só os deixava sair com a Carta de Alforria.

Despertado pela Doutrina Espírita, exemplificou no mais alto grau os ensinamentos cristãos: praticava a caridade, consolava os aflitos, tratava os doentes com a Homeopatia e difundia os princípios espíritas. Fundou o jornal "Verdade e Luz", em 25 de maio de 1890, que chegou a ter tiragem de cinco mil exemplares. Abriu mão de seus bens em favor dos necessitados.

A sua casa, no Lavapés, era ao mesmo tempo hospital, farmácia, albergue, escola e asilo. Ele a doou para a sede da Instituição Beneficente "Verdade e Luz". Recolhia os doentes e os desamparados, infundindo-lhes a fé necessária para poderem suportar suas provas terrenas. A propósito disso, dizia-se de Batuíra: "um bando de aleijados vivia com ele". Quem chegasse à casa, fosse lá quem fosse, tinha cama, mesa e cobertor.

De suas primeiras núpcias com dona Brandina Maria de Jesus, teve um filho, Joaquim Gonçalves Batuíra, que veio a se casar com dona Flora Augusta Gonçalves Batuíra. Das segundas núpcias, teve outro filho, que desencarnou aos 12 anos. Mas, apesar disso, Batuíra era pai de quase toda gente. Exemplo disso foi o Zeca, que Batuíra recebeu com poucos meses e criou como filho adotivo, o qual se tornou continuador de sua obra na instituição beneficente que ele fundara.

Eis alguns traços da personalidade de Batuíra, pela pena do festejado escritor Afonso Schimidt. "Em 1873, por ocasião da terrível epidemia de varíola que assomou a capital da província, ele serviu de médico, de enfermeiro, de pai para flagelados, deu-lhes não apenas o remédio e os desvelos, mas também o pão, o teto e o agasalho. Daí a popularidade de sua figura. Era baixo, entroncado e usava longas barbas que lhe cobriam o peito amplo. Com o tempo, essa barba se fez branca e os amigos diziam que ele era tão bom, que se parecia com o imperador".

Batuíra era tão popular, que foi citado em obra como "História e Tradições de São Paulo", de Ernani Silva Bueno, "A Academia de São Paulo - Tradições e Reminiscências - Estudantes, Estudantões e Estudantadas", de Almeida Nogueira, "A Cidade de São Paulo em 1900", de Alfredo Moreira Pinto. Escreveram ainda sobre ele J.B. Chagas, Afonso Schimidt, Paulo Alves Godoy e Zeus Wantuil.

Batuíra criou grupos espíritas em São Paulo, Minas Gerais e Estado do Rio. Proferiu conferências espíritas por toda parte, criou a Livraria e Editora Espírita, onde se fez impressor e tipógrafo.

Referindo-se ao seu desencarne, Afonso Schimidt escreveu: "Batuíra faleceu a 22 de janeiro de 1909, São Paulo inteiro comoveu-se com seu desaparecimento. Que idade tinha? Nem ele mesmo sabia. Mas o seu nome ficou por aí, como um clarão de bondade, de doçura, de delicadeza do céu, dessas que vão fazendo cada vez mais raras num mundo velho, sem porteira...".

Texto de Apolo Oliva Filho.

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