“O interesse individual é a demonstração da continuação de nossa animalidade. A humanidade começa no homem com o desinteresse.” 1

“Três viajantes encontraram, certa vez, um tesouro.

Depois, sentiram fome, e um deles foi comprar-lhes comida. No caminho, pensou: – Por que não colocar veneno na comida? Comerão e morrerão, e ficarei com todo o tesouro.

Entretanto, seus companheiros deliberaram também matá-lo e dividir entre si sua parte. Quando voltou, assassinaram-no, e comeram a comida envenenada e também morreram.” 2
 

A bela síntese do conto oriental expressa com fidelidade o resultado invariável das ações egoísticas: tragédias, sofrimentos e lágrimas para todos os envolvidos.

Na Terra, onde predomina o egoísmo, ações dessa natureza multiplicam infinitas vezes as consequências do mal. Daí tantos sofrimentos, tantas lágrimas derramadas neste Orbe!

A Doutrina Espírita, com o objetivo de educar o ser humano, esclarece-nos que o mal não cessa com a morte física das personagens. Seus desdobramentos são dolorosos, seja no Plano Espiritual inferior – onde sofremos as consequências de nossos atos, entre os quais o ódio e a perseguição dos próprios desafetos –, seja nas reencarnações penosas, mas reparadoras, que se seguirão aos atos desequilibrados, às vezes ao longo de milênios.

Para nos esclarecer, ela não poupa o egoísmo e suas sequelas.

Lemos em “O Livro dos Espíritos” 3

785. Qual o maior obstáculo ao progresso?

“O orgulho e o egoísmo. Refiro-me ao progresso moral, pois o intelectual avança sempre. (...)” 

913. Dentre os vícios, qual o que se pode considerar radical?

“Já o dissemos muitas vezes: o egoísmo. Dele deriva todo o mal. Estudai todos os vícios e vereis que no fundo de todos há egoísmo (...) aí é que está a verdadeira chaga da sociedade. Quem quiser aproximar-se da perfeição moral, já nesta vida, deve extirpar do seu coração todo sentimento de egoísmo, pois o egoísmo é incompatível com a justiça, o amor e a caridade; ele neutraliza todas as outras qualidades.” 

1019. O reinado do bem poderá implantar-se algum dia na Terra?

“O bem reinará na Terra quando, entre os Espíritos que a vêm habitar, os bons predominarem (...). É pelo progresso moral e pela prática das leis de Deus que o homem atrairá para a Terra os Espíritos bons e dela afastará os maus. Estes, porém, só a deixarão quando o homem tiver banido daí o orgulho e o egoísmo (...).” 

Os Espíritos verberam o egoísmo, e não deixam dúvidas quanto à sua força maléfica:

 [“O egoísmo, esta chaga da Humanidade, tem que desaparecer da Terra, porque impede o seu progresso moral. (...) O egoísmo é, pois, o alvo para o qual todos os verdadeiros crentes devem apontar suas armas, sua força, sua coragem. (...) Que cada um, portanto, empregue todos os esforços a combatê-lo em si, certo de que esse monstro devorador de todas as inteligências, esse filho do orgulho é a fonte de todas as misérias terrenas. (...)

É a esse antagonismo entre a caridade e o egoísmo, à invasão do coração humano por essa chaga moral, que se deve atribuir o fato de não haver ainda o Cristianismo desempenhado por completo a sua missão.”

“A fonte do mal reside no egoísmo e no orgulho: os abusos de toda ordem cessarão quando os homens se regerem pela lei da caridade.” 

“Toda a moral de Jesus se resume na caridade e na humildade, isto é, nas duas virtudes contrárias ao egoísmo e ao orgulho. (...) Orgulho e egoísmo, eis o que não se cansa de combater.”]4 

Antevendo, profeticamente, o somatório do egoísmo de gerações, autores encarnados e desencarnados assinalaram, infelizmente com justas razões, que não haveria descanso, que não haveria segurança para a raça humana, com o predomínio do egoísmo nos corações: 

“O egoísmo é a negação da caridade. (...) sem a caridade não haverá descanso para a sociedade humana. Digo mais: não haverá segurança. Com o egoísmo e o orgulho, que andam de mãos dadas, a vida será sempre uma carreira em que vencerá o mais esperto, uma luta de interesses, em que se calcarão aos pés as mais santas afeições, em que nem sequer os sagrados laços da família merecerão respeito.” 5 

“Não haverá paz entre os homens, não haverá segurança, felicidade social enquanto o egoísmo não for vencido, enquanto não desaparecerem os privilégios, essas perniciosas desigualdades, a fim de cada um participar, pela medida de seus méritos e de seu trabalho, do bem-estar de todos. Não pode haver paz nem harmonia sem justiça.” 6 

Allan Kardec prescreve o remédio contra esse mal terrível: 

“Para que os homens vivam na Terra como irmãos, não basta se lhes deem lições de moral; importa destruir as causas de antagonismo, atacar a raiz do mal: o orgulho e o egoísmo”. 7 

“O homem (...) procura as causas de seus males, a fim de remediá-los. Quando compreender bem que o egoísmo é uma das causas, a que gera o orgulho, a ambição, a cupidez, a inveja, o ódio, o ciúme, que a cada instante o magoam, que leva a perturbação a todas as relações sociais, provoca as dissensões, destrói a confiança, obrigando-o a manter-se constantemente na defensiva contra o seu vizinho, enfim, a causa que faz do amigo um inimigo, então ele compreenderá também que esse vício é incompatível com a sua própria felicidade e, acrescentamos, com a sua própria segurança. (...) 

O egoísmo é a fonte de todos os vícios, como a caridade é a fonte de todas as virtudes. Destruir um e desenvolver a outra, tal deve ser o alvo de todos os esforços do homem (...)”. 8 

A mentora Joanna de Ângelis indica-o, claramente, como o causador das misérias humanas, das quais a Terra atual anda farta de exemplos: 

“Enquanto o egoísmo governe os grupos humanos e espalhe suas torpes sementes, em forma de presunção, de ódio, de orgulho, de indiferença à aflição do próximo, a Humanidade provará a ardência dos desesperos coletivos e das coletivas lágrimas, em chamamentos severos à identificação com o bem e o amor, à caridade e ao sacrifício”. 9 

Os ensinos nos alertam, clara e didaticamente, que o mal supremo encontra-se em nosso íntimo e se chama egoísmo. 

É tempo de o atacarmos pela raiz, extirpando-o de nossos corações. Isto requer vigilância, autoexame, meditação e ações concretas no dia a dia, para edificarmos o Bem em nossas vidas, transformando-nos a pouco e pouco para melhor. 

 

Referências

1. AMIEL. Dicionário de Pensamentos, org. por Folco Masucci. 5. ed. São Paulo: Edições Leia, 1961. 625 pp. p. 173;

2. Al-Ghazzali. As mais Belas Páginas da Literatura Árabe, org. por Mansour Challita, p. 134;

3. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra, 2. ed. 1. impr. Rio de Janeiro: FEB, 2011. p. 365, 418-419; 475-476, 422, e 551, respectivamente;

4. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo.Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1ª reimpressão (atualizada) – Rio de Janeiro: FEB, 2000. Cap. 11, it. 11, pp. 229/30; cap. XVI, it. 8, p. 320; cap. XV, it. 3, p. 302, respectivamente;

5. KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo.Trad. Evandro Noleto Bezerra. 1ª reimpressão (atualizada) – Rio de Janeiro: FEB, 2000. Cap. 11, it. 12, p. 231;

6. DENIS, Léon. Depois da Morte. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978. p. 271;

7. KARDEC, Allan. Obras Póstumas. 34. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2004. p. 226;

8. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra, 2. ed. 1. impr. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Comentários à Q. 917, p. 551.

9. FRANCO, Divaldo P. Após a Tempestade. Espírito Joanna de Ângelis. 5. ed. Salvador: LEAL, 1992. p. 14.


Por  GEBALDO JOSÉ DE SOUSA

 

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