Enquanto falavam estas {coisas}, ele fica em pé no meio deles e lhes diz: Paz para vós! (Lucas 24:36)[2]


A paz é um caminho que deve ser trilhado cotidianamente. Não se configura em um recurso externo a ser anexado à alma humana, mas um estado de espírito a ser construído mediante esforço individual e coletivo.

A saudação de Jesus ao colégio apostólico em Jerusalém, em aparição produzida após a Sua desencarnação, revela o desejo do Mestre de que eles estivessem pacificados, apesar das angústias que cercavam aqueles dias. O que faz muito sentido, considerando as lições preciosas que dEle haviam recebido e o atestado insofismável que apresentava-lhes da imortalidade da alma, descortinando aos amigos uma nova compreensão da vida futura.

Quanto a nós outros, nos dias em que vivemos, voltamo-nos a diversos aprendizados para que possamos dar conta da manutenção da existência física e do conforto da família e, nesse sentido, buscamos alguma formação científica e tecnológica, apropriamo-nos das condições necessárias para o exercício de uma profissão digna.

Em torno de nossa autorrealização, nos matriculamos em cursos variados e, até mesmo nas tarefas espíritas, cônscios de que “Na academia do Evangelho, todos somos alunos”[3], procuramos estudos, treinamentos, palestras, leituras e nos dispomos a vivências que nos ajudem a operacionalizar as informações recolhidas para o serviço que nos compete em prol do próximo.

Todavia, é importante considerar que o nosso mundo carece de paz. Observando a questão da violência em nosso cotidiano, tanto quanto, em relatórios oficiais de caráter nacional e internacional, a razão nos leva a perguntarmo-nos sobre as ações ao nosso alcance para o desenvolvimento da paz íntima e na sociedade.

Emmanuel lembra que existem muitos cursos de formação cultural em nossa realidade material, mas ressalta que é “(...) abençoada (...) a criatura que aprende a viver satisfeita, buscando melhorar-se com paciência para que os outros vivam em paz.”[4] Nesta frase, o guia espiritual de Chico Xavier nos apresenta um verdadeiro curso de paz no qual podemos nos matricular desde já, formado, metaforicamente, por “três componentes curriculares” a saber: contentamento; reforma íntima e paciência.

Quanto ao contentamento, ele significa um estado mental de satisfação e alegria por tudo quanto se desdobra na existência do ser, desde aspectos singelos a outros de maior relevo. Traduz em atitude o sentimento de gratidão a Deus pela solicitude que desdobra sobre todos nós. Para tanto, recorda-nos o benfeitor (...) que Paulo de Tarso, o apóstolo chamado por Jesus para a disseminação da verdade divina, entre os homens, foi obrigado a aprender a contentar-se com o que possuía, penetrando o caminho de disciplinas acerbas.”[5]

E, dessa forma, temos no apóstolo da gentilidade uma referência para sermos sempre gratos, limitando os nossos desejos. Essa atitude produz serenidade d’alma. Quem exercita o contentamento desenvolve uma perspectiva otimista da vida pela felicidade que flui de si mesmo ao reconhecer as dádivas que a Providência Divina lhe alcança, admitindo, por sua vez, cada dia como uma nova oportunidade de crescimento, usufruto e partilha das bênçãos de Deus.

Neste curso de paz nos surge a necessidade de reforma íntima e, neste tema, Emmanuel diz que:

O entendimento na Doutrina Espírita esclarece-nos a cada um que é loucura reclamar a santificação compulsória e, sim, que é dever simples de nossa parte operar a própria transformação para o bem, a fim de que sejamos para os outros, ainda hoje, o que desejamos sejam eles para nós amanhã.[6]


A reforma íntima não se dá abruptamente, é um paulatino processo de autotransformação que devemos encetar, de renovação de ideias, valores e atitudes cuja técnica básica reside no autoconhecimento, recomendado pelos Espíritos Superiores em O Livro dos Espíritos e descrito por Santo Agostinho como um exercício de problematização da própria conduta que deveria ser experimentada ao cabo de cada dia pelo indivíduo, a fim de que aprenda a valorar a razão de ser de sua conduta e identificar as aprendizagens morais necessárias e aquelas já realizadas.

Por fim, a produção da paz interior também nos pede o desenvolvimento da virtude da paciência. O guia espiritual de Chico Xavier orienta, em um de seus belos textos de estudo do Evangelho, que a paciência não consiste na atitude equivocada de se concordar com os erros que encontramos na jornada terrestre. “Ter paciência, então, será resistir aos impulsos inferiores que nos cerquem na estrada evolutiva, conduzindo todo o bem que nos seja possível aos seres e coisas que se achem diante de nós, como a representação desses mesmos impulsos.”[7]

Sendo uma virtude indispensável para a paz nos relacionamentos humanos e à serenidade como estado mental permanente, a paciência exercitada pode ser compreendida como uma prática espiritual a ser adotada, assim como a prece ou a meditação. Concentrar a nossa sensibilidade em prol do desenvolvimento da paciência no trato com os outros e conosco mesmo é praticar o bem, e segundo os Espíritos, “As boas ações são a melhor prece, porque os atos valem mais do que as palavras.”[8] Portanto, praticar a paciência é fomentar a paz em si mesmo e na convivência com demais irmãos de caminhada evolutiva.

Em O evangelho segundo o Espiritismo, a mensagem do Espírito Amigo[9] nos convoca a sermos pacientes e ao entendimento de que a paciência é uma expressão da caridade recomendada por Jesus, onde devemos, inclusive, perdoar aqueles que nos colocam à prova a paciência por um motivo qualquer.

Logo, caros amigos, foquemos os nossos esforços para a construção da paz no mundo tendo por ponto de partida nós mesmos, dedicando-nos à aprendizagem destas três lições do “curso de paz” mencionado acima: contentamento, reforma íntima e paciência.


Por Vinícius Lima Lousada[1]

Referências: [1] Vice-presidente de Unificação da Fergs. [2] O Novo Testamento. trad. Haroldo Dutra Dias. FEB. Edição do Kindle. [3] VIEIRA, Waldo. Conduta espírita. Pelo Espírito André Luiz. FEB - Edicei of America. Edição do Kindle. [4] XAVIER, Francisco C.. Pronto-socorro. Pelo Espírito Emmanuel. Brasília: FEB; São Paulo: CEU, 2015, p. 63. [5] XAVIER, Francisco Cândido. O evangelho por Emmanuel: comentários às Cartas de Paulo). Pelo Espírito Emmanuel. FEB Editora. Edição do Kindle. (Filipenses 4: 11). [6] XAVIER, Francisco Cândido. Seara dos médiuns. Pelo Espírito Emmanuel. FEB Publisher. Edição do Kindle, cap.89. [7] XAVIER, Francisco Cândido. O Evangelho por Emmanuel: comentários ao evangelho de Lucas. Pelo Espírito Emmanuel. FEB Publisher. Edição do Kindle (Lucas 21:19) [8] KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. FEB Publisher. Edição do Kindle, questão 621. [9] KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. FEB Publisher. Edição do Kindle, cap. IX, item 7.

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