O que implicam as mudanças? Quando elas são necessárias? Por que resistimos a elas? Estamos voltados ao cultivo da mudança interior ou buscamos mais a exterior?

 

         

Criaturas existem que não gastam um só minuto de seu dia para se questionarem. Não se perguntam: o que tenho a meu dispor é realmente bom para mim? É autêntico ou estou preferindo me enganar? O que quero da vida? O que estou buscando? Desejo mesmo viver o que vivo, fazer o que faço? Pretendo continuar assim como estou?

         

Pode parecer que as pessoas pensam sobre essas coisas. Porém, na prática, são poucas as que conseguem, realmente, compreender a essência de seus pensamentos, sentimentos e comportamentos.

         

Vivemos em uma época em que prevalece o mais rápido, fácil e divertido, ou seja, a superficialidade, as aparências.  Assim, e por falta deste tipo de reflexão, muitos agem impensadamente, não medindo o alcance de suas atitudes e nem se dando conta das coisas ao seu redor.

         

Mas, se não sabemos o que é bom e verdadeiro ou o que queremos realmente, o que estamos fazendo de nossa existência? Para aonde estamos nos conduzindo?      

         

Necessitamos, portanto, adotar uma constante observação interna e externa para captarmos o real sentido das coisas. Nada existe sem uma razão de ser. Tudo o que nos envolve carrega um significado de extrema importância; no entanto, nós temos o hábito de acreditar que somos acima da média. E, por isso, não refletimos sobre os problemas e dificuldades, de modo a enfrentá-los verdadeiramente.  

         

É muito difícil alterar o padrão de pensamento, sentimento e comportamento de uma vida inteira, se não sabemos exatamente quem somos e quais as nossas reais necessidades. E uma das razões para não efetuarmos as mudanças necessárias é que nos conhecemos apenas parcialmente, não compreendendo o suficiente para perceber quando tais mudanças efetivamente precisam acontecer. 

         

Mohandas Gandhi, mais conhecido como Mahatma Ghandi (1869-1948), indiano defensor do princípio da não-violência como um meio de protesto, certa feita disse: “Nós temos que ser a mudança.”  [1]

         

E o que significa a palavra mudar? Nada mais do que, simplesmente, “dar outra direção, arrumar de outro modo, deixar uma coisa por outra, transformar.”  [2]

 

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Jesus, diante de um homem paralítico há 38 anos, pergunta-lhe: “Queres ser curado?”(João 5:6). [3]  E o homem disse que sim, que queria ser curado daquele mal.

         

O Cristo sabia que a busca por alternativas e um consciente desejo de melhoria são fatores fundamentais para uma efetiva reabilitação. Tanto que, em diversas outras situações, quando alguém se recuperava, ele dizia: “Tua fé te curou”

         

Sendo assim, sua pergunta teve por objetivo levar o paralítico a refletir sobre a importância da própria força de vontade e confiança.  

         

O Evangelho segundo o Espiritismo, ao se referir sobre a diferença entre os espíritas imperfeitos e os verdadeiros, traz: 

 

Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que faz para domar as suas más inclinações; enquanto que um se compraz em seu horizonte limitado, o outro, que compreende alguma coisa de melhor, se esforça para dele de libertar e sempre o consegue quando tem vontade firme. [4]

 

Entregar-se à doença, aos problemas e conflitos, às dificuldades é a mais perfeita contribuição para que todos eles continuem com seu ciclo de sofrimento, de paralisação e até de destruição, dependendo do caso.  Por outro lado, buscar tenazmente o equilíbrio e bem-estar significa, principalmente, não atribuir à outra pessoa a responsabilidade pelo nosso processo de reabilitação, de cura. 

         

O meu salvador sou eu mesmo. Tanto que Jesus mostrou que o remédio estava no próprio paralítico e não fora dele. Assim, o necessário medicamento era mais interno que externo. Ele poderia simplesmente ter-lhe dito: “levanta-te e anda”. Mas preferiu falar:  “Levanta-te, toma o teu leito e anda.” (João 5:8)  Isto é, toma a tua estrada, tua própria pessoa e segue a tua vida.

         

Com esta passagem, podemos afirmar que o Cristo fez com que o doente superasse as próprias resistências internas, estimulando-lhe a força de vontade e confiança. 

         

E quanto ainda nos custa perceber que o que impede ou protela a solução dos problemas, sejam eles físicos ou psicológicos, é a nossa resistência às mudanças!  

         

Somos ainda fortemente apegados à própria maneira de pensar e agir e, com grande frequência, recusamos tudo o que nos questione ou que aponte nossas falhas. Ainda acreditamos ser humilhante ter de admitir nossos equívocos e alterar posturas e decisões. 

         

É a mudança interior que deve ser buscada, muito mais que a exterior. Porém, existem indivíduos que, diante de uma situação aflitiva, resolvem viajar ou mudar de lugar, de trabalho, de casa, como se a crise dependesse única e exclusivamente do mundo externo e do local onde estão. Outros procuram mudar as pessoas com as quais convivem, arrumar a vida delas, por crerem ser seu dever rearranjar o mundo, e não a si mesmos. Há, ainda, aqueles que se escondem nos vícios, desenvolvendo manias e doenças. No entanto, agindo assim, essas pessoas jamais encontrarão o que, de fato, as preencherá íntima e plenamente.

         

Para ilustrar as consequências de nossa resistência, o Espírito Hammed faz uma analogia entre a água corrente e a estagnada: 

 

a água renovada é corrente, oriunda das chuvas, do orvalho, das nascentes, enquanto que a água estagnada é aquela que, em breve, por inércia, se deteriorará, tornando-se um foco de larvas e de putrefação. [5]

 

Quando não permitimos a mudança em nosso mundo interior, exigimos a mudança na realidade exterior. E, com isso, facilmente a culpamos por não corresponder às nossas expectativas. É óbvio, também, que a necessidade de diferentes arrumações (mudanças) em nossa existência afetará nosso comodismo e conforto, solicitando de nós uma reciclagem de conceitos, crenças e valores, um repensar de posturas, modificações nos costumes e hábitos e um diferente direcionamento aos pensamentos e sentimentos, o que, admitamos, não é fácil tarefa, mas dependerá apenas de nós realizá-la. 

 

Ainda do Espírito Hammed: 

 

Na realidade, quem se permite mudar pode ficar, inicialmente, numa situação desconfortável, visto que poderá ficar exposto a algo que não contava ou que não havia percebido. O que acontece é que, quando alteramos o nosso "status quo" – (...) modificamos nossa antiga maneira de interpretar, entender, expressar e dar sentido e importância às coisas. A partir disso, nossas zonas de estabilidade ficam temporariamente ameaçadas; nosso jeito anterior de ser e ver não funciona mais. Tudo isso acarreta uma batalha interna que gera desconfiança, medo e insegurança, até que nos reestruturemos novamente. [6]

 

Em virtude desse desconforto, que é apenas inicial,no entanto, muitos permanecem paralisados em seus ‘leitos’. Não conseguem se levantar, tomar posse de sua vida e avançar.  

        

Jesus também disse: “Se alguém quer vier após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me” (Marcos 8:34)

         

As mudanças necessárias não deixam de representar um processo trabalhoso, uma “cruz” que precisamos abraçar todos os dias. Todavia, Jesus deu a entender que, se o adotássemos por modelo, certamente não fracassaríamos em nossa empreitada. E segui-lo não significa que necessariamente tenhamos de mudar o caminho, mas, na grande maioria das vezes, apenas o jeito de caminhar! 

         

O Espírito Joanna de Ângelis assim nos estimula: 

 

Quando alguém aspira por mudanças para melhor, irradia energias saudáveis, do campo mental, que contribuem para a realização da meta. Através de contínuos esforços, direcionados para o objetivo, cria novos condicionamentos que levam ao êxito, como decorrência normal do querer. Nenhum milagre ou inusitado ocorre, nessa atitude que resulta do empenho individual. [7]

 

No caso do paralítico, não foi Jesus quem o curou, mas o doente que se reabilitou em contato com o Cristo. Como afirma de Ângelis, nenhum milagre acontece, porque a cura é a consequência das próprias buscas. Nas palavras dos Espíritos Superiores, ela é, simplesmente, o resultado de uma firme vontade.

 

 

Silvia Helena Visnadi Pessenda

sivipessenda@uol.com.br

 

 

REFERÊNCIA 

 

[1] CARLSON, Richard; SHIELD, Benjamin (Org.). Os caminhos do coração: ensaios originais sobre o amor. Rio de Janeiro: Sextante, 2000:173   (Literatura não espírita)

 

[2] Michaelis: moderno dicionário da língua portuguesa. São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998.

 

[3]  BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudo Almeida. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.

 

[4] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Salvador Gentile, revisão de Elias Barbosa. 195. ed. Araras, SP: IDE, 1996. cap. XVII, item 4.

 

[5] HAMMED (espírito); SANTO NETO, Francisco do Espírito (psicografado por). Um modo de entender: uma nova forma de viver. Catanduva, SP: Boa Nova Editora, 2004. cap. 8.

 

[6] HAMMED (espírito); SANTO NETO, Francisco do Espírito (psicografado por). A imensidão dos sentidos. 3. ed. Catanduva, SP: Boa Nova Editora, 2000: 92.

 

[7] ÂNGELIS, Joanna de (espírito); FRANCO, Divaldo Pereira (psicografado por). O ser consciente. Salvador, BA: Livr. Espírita Alvorada. cap. 8.

 

 

NOVAES, Adenáuer Marcos Ferraz de. Psicologia do Evangelho. 2. ed. Salvador, BA: Fundação Lar Harmonia, 2001.

 

JOSÉ ANTONIO (espírito); VARGAS, Ana Cristina (psicografado por). O quarto crescente. Catanduva, SP: Boa Nova Editora. 2007.

 

VITOR, Francisco de Paula (espírito); TEIXEIRA, José Raul (psicografado por). Quem é o Cristo? Niterói: Fráter, 1998. 

 

 

Literatura não espírita

 

HUNTER, James C. O monge e o executivo. 13. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2004. 

 

BAKER,  Mark W. Jesus, o maior Psicólogo que já existiu. 3. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.

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