Tendo a matéria que ser objeto do trabalho do Espírito para desenvolvimento de suas faculdades, era necessário que ele pudesse atuar sobre ela, pelo que veio habitá­-la, como o lenhador habita a floresta. 

Tendo a matéria que ser, no mesmo tempo, objeto e instrumento do trabalho, Deus, em vez de unir o Espírito à pedra rígida, criou, para seu uso, corpos organizados, flexíveis, capazes de receber todas as impulsões da sua vontade e de se prestarem a todos os seus movimentos.

O corpo é, pois, simultaneamente, o envoltório e o instrumento do Espírito e, à medida que este adquire novas aptidões, reveste outro invólucro apropriado ao novo gênero de trabalho que lhe cabe executar, tal qual se faz com o operário, a quem é dado instrumento menos grosseiro, à proporção que ele se vai mostrando apto a executar obra mais bem cuidada.

Para ser mais exato, é preciso dizer que é o próprio Espírito que modela o seu envoltório e o apropria às suas novas necessidades; aperfeiçoa­, lhe desenvolve e completa o organismo, à medida que experimenta a necessidade de manifestar novas faculdades; numa palavra, talha­-o de acordo com a sua inteligência. Deus lhe fornece os materiais; cabe-­lhe a ele empregá-­los. É assim que as raças adiantadas têm um organismo ou, se quiserem, um aparelhamento cerebral mais aperfeiçoado do que as raças primitivas. Desse modo igualmente se explica o cunho especial que o caráter do Espírito imprime aos traços da fisionomia e às linhas do corpo. 

Desde que um Espírito nasce para a vida espiritual, tem, por adiantar­-se, que fazer uso de suas faculdades, rudimentares a princípio. Por isso é que reveste um envoltório adequado ao seu estado de infância intelectual, envoltório que ele abandona para tomar outro, à proporção que se lhe aumentam as forças. Ora como em todos os tempos houve mundos e esses mundos deram nascimento a corpos organizados próprios a receber Espíritos, em todos os tempos os Espíritos, qualquer que fosse o grau de adiantamento que houvessem alcançado, encontraram os elementos necessários à sua vida carnal.

Por ser exclusivamente material, o corpo sofre as vicissitudes da matéria. Depois de funcionar por algum tempo, ele se desorganiza e decompõe. O princípio vital, não mais encontrando elemento para sua atividade, se extingue e o corpo morre. O Espírito, para quem, este, carente de vida, se torna inútil, deixa­-o, como se deixa uma casa em ruínas, ou uma roupa imprestável.

O corpo, conseguintemente, não passa de um envoltório destinado a receber o Espírito. Desde então, pouco importam a sua origem e os materiais que entraram na sua construção. Seja ou não o corpo do homem uma criação especial, o que não padece dúvida é que tem a formá-­lo os mesmos elementos que o dos animais, a animá­-lo o mesmo princípio vital, ou, por outra, a aquecê-­lo o mesmo fogo, como tem a iluminá-­lo a mesma luz e se acha sujeito às mesmas vicissitudes e às mesmas necessidades. É um ponto este que não sofre contestação.

A não se considerar, pois, senão a matéria, abstraindo do Espírito, o homem nada tem que o distinga do animal. Tudo, porém, muda de aspecto, logo que se estabelece distinção entre a habitação e o habitante.

Ou numa choupana, ou envergando as vestes de um campônio, um nobre senhor não deixa de o ser. O mesmo se dá com o homem: não é a sua vestidura de carne que o coloca acima do bruto e faz dele um ser à parte; é o seu ser espiritual, seu Espírito.

Referências:

A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo - Cap. XI - Allan Kardec.

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