Ana, a avó de Jesus, lembrando do nascimento do primogênito de sua filha Maria, contava, emocionada:


Sei que, quando Ele nasceu, foi visitado por homens do Oriente. Eram persas que vieram com suas caravanas.


Quando entraram na casa em que se encontravam Maria e seu filho, tiraram ouro de suas bolsas, além de mirra e incenso, e colocaram tudo aos pés do bebê.


Depois, caíram de joelhos e oraram num idioma estranho.


Partiram ao raiar do dia, seguindo por outros caminhos, soubemos depois, porque foram avisados em sonho de que não deveriam informar ao rei Herodes onde se encontrava o Menino.


Antes, porém, disseram:


Vimos a luz de nosso Deus nos olhos do Pequeno e o sorriso de nosso Deus em Seus lábios. Pedimos que nosso Deus O proteja, e Ele protegerá a todos nós.


Em seguida, montaram em seus camelos, e se foram, retornando aos locais de suas origens.


Maria parecia mais maravilhada e surpresa com Seu primogênito do que alegre. Ficava um bom tempo olhando para o Filho, e então virava o rosto para a janela e fitava o céu, à distância, como se estivesse tendo visões.


O Menino cresceu em corpo e Espírito, e era diferente das outras crianças. Arredio e obstinado, eu não conseguia controlá-lO. Mesmo assim, Ele era amado por todo mundo em Nazaré, e, no fundo, eu sabia porquê.


Muitas vezes, Ele pegava da nossa comida para dar aos transeuntes, ou entregava a outras crianças os doces que eu lhe dera, antes mesmo de prová-los.


Subia nas árvores do pomar para colher os frutos, mas nunca com a intenção de comê-los Ele mesmo.


Quando apostava corrida com os outros meninos, por ser mais veloz, demorava-se, para deixar que eles chegassem antes.


E, às vezes, quando eu O levava para a cama, falava: "Diz para a minha mãe e para os outros que só o Meu corpo dormirá. Meu Espírito estará com eles, até que o Espírito deles venha a Mim de manhã."


E Ele disse muitas outras coisas maravilhosas na infância, mas estou velha demais para lembrar.


Dizem-me que não O verei mais. Mas, como posso acreditar no que eles dizem?


Ainda ouço Sua risada e o som de Seus passos, correndo pela casa. E sempre que beijo minha filha no rosto, Sua fragrância regressa a meu coração, e é como se Seu corpo preenchesse meus braços.


Khalil Gebran

 Cap. intitulado _Ana, mãe de Maria_, do livro _Jesus, O Filho do Homem_,  editora Martin Claret, por Khalil Gibran (1883-1931),  ensaísta, prosador, poeta, conferencista, filósofo e pintor de origem libanesa.

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